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Cardápio vegano para receber príncipe deixa chef da Amazônia furioso

  • Foto do escritor: Prof. Daniel  Fernandes
    Prof. Daniel Fernandes
  • 29 de out.
  • 4 min de leitura
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Deu no The New York Times


Ele foi convidado a preparar um evento sobre o clima para o Príncipe William e 700 convidados. Mas omitir o famoso peixe amazônico foi como "pedir ao Iron Maiden para tocar jazz".


O Prêmio Earthshot, uma premiação ambiental fundada pelo Príncipe William, exigia um menu à base de plantas para um jantar no Rio de Janeiro no próximo mês. O chef brasileiro inicialmente selecionado para o evento, Saulo Jennings, ficou surpreso ao saber que não poderia servir peixe da Amazônia.Crédito...Foto da piscina por Justin Tallis

 

Reportagem do Rio de Janeiro

 

Quando Saulo Jennings soube que cozinharia para um herdeiro do trono britânico, o chef brasileiro sabia que queria destacar o ingrediente principal da Amazônia: um peixe de rio enorme e carnudo chamado pirarucu.


O herdeiro, Príncipe William, estava organizando uma cerimônia de premiação ambiental do Earthshot Prize para 700 convidados no Rio de Janeiro, no início de novembro, em sua primeira visita ao Brasil. Criar os canapés pareceu o trabalho perfeito para o Sr. Jennings, um aclamado chef da Amazônia conhecido por usar ingredientes sustentáveis ​​da floresta tropical.


Mas havia uma condição: o cardápio tinha que ser 100% vegano, disse o Sr. Jennings, que afirmou ter sido informado pela organização Earthshot.

Inicialmente, convencido de que havia entendido errado, o chef disse que se ofereceu para adicionar uma opção vegana ao cardápio. Depois, afirmou que, ao ser informado de que não poderia usar nenhuma das espécies de peixes de rio tão apreciadas e essenciais para seus pratos e para a culinária da região amazônica, ficou ofendido.


“É como pedir ao Iron Maiden para tocar jazz”, disse o Sr. Jennings em entrevista na sexta-feira. “Foi uma falta de respeito”, acrescentou, “pela culinária local, pela nossa tradição gastronômica.”


Após muita insistência do museu que sediará o evento, o Sr. Jennings disse ter criado um cardápio vegano inspirado em ingredientes amazônicos como raiz de mandioca, folha de jambu e castanha-do-pará. Mas, a essa altura, as negociações para o serviço de buffet do evento haviam fracassado. E agora, ele está fora da disputa pelo serviço de buffet para o evento, marcado para 5 de novembro.

 

“Não tenho nada contra veganos ou britânicos”, disse ele. “Mas não quero abandonar minha missão culinária.”


A indignação do chef com a exigência virou notícia no Brasil, já que muitos interpretaram o pedido no cardápio como um desprezo à rica tradição culinária da região amazônica, onde será realizada a conferência anual das Nações Unidas sobre o clima. William, juntamente com chefes de Estado, cientistas e políticos de todo o mundo, estará presente.


O Sr. Jennings também estava perplexo. Ele havia cozinhado sem problemas para a cerimônia de coroação do Rei Carlos III, pai de William, na Embaixada Britânica no Brasil.


“Eu fiz peixe com batatas fritas”, disse ele, “mas com pirarucu”.


A polêmica em torno do cardápio também levantou questões sobre o que pode ser considerado alimento amigo do clima, em um momento em que os consumidores estão cada vez mais preocupados com a sustentabilidade e as marcas estão ansiosas para rotular os ingredientes como provenientes de fontes responsáveis.


Um porta-voz de William recusou-se a comentar a situação. Mas uma pessoa próxima ao evento climático, que pediu para permanecer anônima para poder discutir o assunto delicado publicamente, afirmou que o príncipe não esteve envolvido na elaboração do cardápio.


A pessoa disse que o evento do Prêmio Earthshot, que concede milhões de dólares a pessoas por suas contribuições ao ambientalismo, havia solicitado comida vegetariana, em vez de vegana, porque sempre serve esse tipo de cardápio como parte de seu compromisso com a sustentabilidade.


No final, o Sr. Jennings, segundo a fonte, não foi escolhido para fornecer o serviço de buffet para o evento devido a restrições orçamentárias, e não por qualquer resistência em criar um cardápio sem peixe.

Enquanto um cardápio vegetariano exclui carne e peixe, uma dieta vegana omite todos os produtos de origem animal, incluindo leite, queijo e mel.

 

O Sr. Jennings construiu sua carreira argumentando que a verdadeira sustentabilidade está ancorada nas técnicas culinárias tradicionais que têm sido usadas por gerações pelos povos indígenas de sua região natal.


“Comemos o que as florestas nos dão, o que os rios nos dão”, disse o Sr. Jennings, embaixador da gastronomia da ONU. “Alguns dias comemos peixe. Outros dias, comemos nozes e açaí”, acrescentou. “Isso também é sustentável.”


Defensores do meio ambiente afirmam que uma maneira fundamental de deter a destruição da Amazônia é incentivar o uso sustentável de seus recursos naturais. Isso inclui a coleta de castanhas-do-pará e a pesca controlada de espécies nativas que prosperam nos rios amazônicos.


A espécie pirarucu provou ser um desses casos de sucesso. Um peixe pré-histórico que pode chegar a pesar 200 quilos, estava à beira da extinção há poucas décadas, quando pescadores ilegais saqueavam os rios indiscriminadamente em busca desse peixe lucrativo.


Mas, nos últimos anos, muitos projetos comunitários na Amazônia conseguiram conter a sobrepesca e criar cadeias de suprimento de pirarucu mais sustentáveis. Esse peixe, proveniente de fontes sustentáveis, é então vendido a clientes como o Sr. Jennings, que o transforma em pratos refinados vendidos em seus três restaurantes no Brasil.


Em algumas semanas, o Sr. Jennings terá outra oportunidade de mostrar as tradições culinárias de sua região. Ele foi contratado para cozinhar para as delegações norueguesa e chinesa na conferência sobre o clima. E, a pedido do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, ele oferecerá um jantar de gala para

chefes de Estado, afirmou. O que terá no cardápio? “Com todo o respeito”, disse ele, “haverá peixes”.


Lis Moriconi contribuiu com a reportagem.


Ana Ionova é colaboradora do The Times e reside no Rio de Janeiro, cobrindo o Brasil e os países vizinhos.

 
 
 

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